Espinosa, meu éden

Espinosa, meu éden

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

269 - O poeta-mor da música brasileira de volta aos palcos

Alvíssaras! Chico Buarque de Hollanda está de volta aos palcos. O maior compositor da história da música brasileira volta a se apresentar nos palcos do país, depois de um período de cinco anos de afastamento, desde os shows do disco "Carioca", de 2006. Com 45 anos de carreira, 40 discos lançados e mais de 400 músicas compostas, entre elas alguns dos maiores clássicos da música popular brasileira no currículo, Chico Buarque é a estrela maior do Brasil musical. 
Vamos conhecer um pouco da história desse gênio das artes. A matéria é muito longa, eu reconheço, mas não se pode descrever toda a vida, a obra, a versatilidade e o desmedido talento de Chico em poucas linhas. A riqueza de sua história não cabe em um pequeno texto, por isso tenham paciência e conheçam um apanhado geral de toda a sua brilhante trajetória.  


No dia 19 de junho de 1944 nasce, na Maternidade São Sebastião, no Largo do Machado, Rio de Janeiro, Francisco Buarque de Hollanda, o quarto dos sete filhos do historiador e sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda e da pianista amadora Maria Amélia Cesário Alvim. Em 1946  a família muda-se do Rio para a Rua Haddock Lobo, em São Paulo. Seu pai é nomeado diretor do Museu do Ipiranga. Aos cinco anos de idade parece surgir seu primeiro interesse pela música, materializado sob a forma de um álbum de recortes com fotos de cantores do rádio. Sérgio Buarque é convidado, em 1953, para dar aulas na Universidade de Roma e a família muda-se para a Itália. Ao partir para a Europa, se despediria da avó com um profético bilhete: "Vovó, você está muito velha e quando eu voltar eu não vou ver você mais, mas eu vou ser cantor de rádio e você poderá ligar o rádio do Céu, se sentir saudades". Compõe suas primeiras "marchinhas de carnaval" e torna-se trilingue, falando inglês na escola (norte-americana) e italiano nas ruas. Durante a estada da família na Itália, em 1954, costumava ficar instalado no alto da escada, quando o mandavam dormir, para não perder a conversa dos pais com amigos. A casa, em Roma, é freqüentada por personalidades da cultura brasileira, entre elas Vinicius de Moraes, de quem, mais tarde, se tornaria amigo e parceiro. A família volta a residir no Brasil. Sua irmã Ana de Hollanda, a "Baía", conta que aos doze, treze anos de idade, já de volta a São Paulo, Chico compôs,  entre 1956 e 1957, "umas operetas" que eram cantadas em conjunto com as irmãs mais novas, Ana, Cristina e Pii. A família muda-se para um casarão na rua Buri, a poucos quarteirões do Estádio do Pacaembu. Embora fosse um apaixonado torcedor do Fluminense, a camisa que seu ídolo vestia era a do Santos. Seu nome: Paulo César de Araújo, o Pagão, nome que Chico adota até hoje, em homenagem ao craque, quando veste a camisa número 9 de seu time de futebol, o Politheama. Alguns amigos brincam, afirmando que Chico só se tornou músico porque não conseguiu brilhar no futebol. Na escola é sempre visto com um livro na mão. Lê os clássicos da literatura francesa, alemã e russa, e só se interessa pela literatura brasileira depois que um colega o critica por ler apenas estrangeiros. É repreendido por desfilar pelo colégio com um raro exemplar da primeira edição de Macunaíma, de Mário de Andrade, retirado da estante do pai.
O garoto Francisco Buarque de Hollanda
Ingressa, influenciado por um professor, em um movimento religioso chamado "Ultramontanos", precursor da organização ultraconservadora "TFP - Tradição, Família e Propriedade". Seu envolvimento com os Ultramontanos é cada vez maior. Já não dá mais tanta bola ao futebol e para ir à missa, durante as férias, chega a andar oito quilômetros por dia na fazenda de um amigo. Os pais, preocupados, mandam o rapaz para um internato em Cataguases, no interior de Minas Gerais, por um semestre. Ao retornar a São Paulo voltaria a participar de um movimento religioso, agora de cunho social, chamado "Organização Auxílio Fraterno", que levava cobertores e alimentos para os miseráveis que dormiam nas calçadas. Apesar de não acreditar na caridade como solução para os problemas sociais, Chico relatou, em uma entrevista, que sem esta experiência poderia ter se transformado em uma pessoa "alienada".
Nessa época, já mostrava um grande interesse pela música. Além dos sambas tradicionais de Noel Rosa, Ismael Silva, Ataulfo Alves, também ouvia canções estrangeiras. Entre os seus preferidos estavam o belga Jacques Brel e os norte-americanos Elvis Presley e o grupo The Platters. Mas foi o disco "Chega de Saudade", de João Gilberto, que alterou definitivamente sua relação com a música. Ele o ouvia tão insistente e repetidamente que chegava a irritar os vizinhos. Nem mesmo sua irmã Miúcha, que mais tarde se casaria com João Gilberto, aguentava ouvir sempre o mesmo som. Seu sonho, na época, "era cantar como João Gilberto, fazer música como Tom Jobim e letra como Vinícius de Moraes". Publica em 1961, suas primeiras crônicas no jornal por ele batizado de Verbâmidas, do Colégio Santa Cruz. Sonhava um dia vê-las publicadas nas grandes revistas semanais, ao lado de cronistas consagrados. Sua primeira aparição na imprensa, entretanto, não foi na seção cultural, como imaginava, mas nas páginas policiais do jornal Última Hora, de São Paulo. Chico e um amigo "puxaram" um carro para dar umas voltas pela madrugada paulista, uma brincadeira comum na época. A diversão acabou na cadeia. A manchete destacava: "Pivetes furtaram um carro: presos" e estampava a foto dos dois menores, com os olhos cobertos pelas tarjas pretas. A pena imposta pelo juiz dizia que até que completasse 18 anos Chico não poderia sair sozinho à noite.
Em 1963 ingressa na FAU - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Frustrando o desejo da avó materna, Maria do Carmo, que sonhava ver o neto desenhando cidades, Chico abandonaria o curso três anos depois. Um dos ingredientes para a decisão é o clima de repressão que toma conta das universidades após o golpe militar de 1964. Apresenta-se pela primeira vez em um show, no Colégio Santa Cruz. A música "Tem Mais Samba", feita sob encomenda para o musical "Balanço de Orfeu" - e que Chico ainda hoje considera o marco zero de sua carreira - também é desse ano, quando novos talentos começam a despontar na Música Popular Brasileira, abrindo caminho para a era dos festivais.
Chico e Bituca juntos em uma apresentação
O espetáculo mais célebre de então seria organizado no teatro Paramount, na avenida Brigadeiro Luiz Antônio, em São Paulo, e ficou conhecido como "O Fino da Bossa", comandado por Elis Regina. No palco de "O Fino da Bossa" estariam, entre outros, Alaíde Costa, Zimbo Trio, Oscar Castro Neves, Jorge Ben, Nara Leão, Sérgio Mendes e Os Cariocas. É realizado, no auditório do Colégio Rio Branco, o show "Primeira Audição", abrindo espaço para os músicos da nova geração. É lá que Chico mostra, entre outras, a sua canção "Marcha para um Dia de Sol". Em 1965 é lançado seu primeiro compacto com "Pedro Pedreiro" e "Sonho de um Carnaval", sua primeira música inscrita em um festival, o da TV Excelsior. A canção defendida e depois gravada por Geraldo Vandré não se classifica. O primeiro lugar vai para "Arrastão", de Edu Lobo e Vinicius de Moraes, interpretada por Elis Regina. Chico aparece ao lado de Eva Wilma e John Herbert em uma novela da TV Tupi ("Prisioneiro do Sonho"), onde é apresentado como um dos "craques da Bossa Nova". Faz as músicas para a peça "Morte e Vida Severina", de João Cabral de Melo Neto, cuja montagem ganha os prêmios de crítica e público no IV Festival de Teatro Universitário de Nancy, na França. No Juão Sebastião Bar, reduto paulista da Bossa Nova na época, conhece Gilberto Gil. Nesse mesmo ano conhece Caetano Veloso, que se entusiasmara ao ouvir Chico cantando "Olê, Olá" num show estudantil. Nas festas promovidas no porão da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) conhece, entre outros, Taiguara e João do Vale, autor da famosa "Carcará". Estimulada pelo sucesso dos shows do ano anterior, a TV Record lança o programa "O Fino da Bossa", com um bloco especial, o "Primeira audição", que se converte em espaço permanente para novos compositores. Recebe seu primeiro cachê - 50 mil cruzeiros, cerca de 30 dólares da época - por sua participação no espetáculo "O Momento é a Bossa", promovido por Walter Silva, o "Picapau", no Cine Ouro Verde, de Campinas.
Chico e Nara Leão
Em 1966, a sua música "A Banda" divide com "Disparada", de Théo de Barros e Geraldo Vandré, o primeiro lugar no II Festival de Música Popular Brasileira, promovido pela Record. A composição é um sucesso imediato, tendo vendido mais de cem mil cópias em uma semana. Saudada com uma crônica por ninguém menos que o poeta Carlos Drummond de Andrade, "A Banda" é imediatamente traduzida para vários idiomas (desde 1978 integra o repertório da Band of Irish Guards, uma das corporações musicais que se apresentam durante a troca de guarda do Palácio de Buckingham, na Inglaterra).
Muda-se para o Rio de Janeiro e lança seu primeiro LP pela RGE, "Chico Buarque de Hollanda". Ocorre seu primeiro embate com a censura: a música "Tamandaré", incluída no repertório do show "Meu Refrão" (com o grupo MPB-4 e Odette Lara), é proibida após seis meses em cartaz, por conter frases consideradas ofensivas ao patrono da Marinha, cujo rosto aparecia na velha cédula de um cruzeiro. Torna-se o mais novo artista a gravar um depoimento para o Museu da Imagem e do Som, privilégio até então reservado a personalidades de gerações anteriores. Realiza seu primeiro trabalho para o público infantil compondo as músicas para a peça "O Patinho Feio".
Conhece Marieta Severo Lins, que lhe foi apresentada por Hugo Carvana. Em 1967, torna-se, no dizer de Millôr Fernandes (com quem viria a ter sério desentendimento anos mais tarde), "a única unanimidade nacional". Mesmo morando no Rio, continua mantendo vínculos com São Paulo, onde passa a gravar, ao lado de Nara Leão, o programa musical "Pra Ver a Banda Passar", da TV Record, além de um programa diário na Rádio Jovem Pan. Tímido e sem muito jeito para televisão, o único espetáculo de que Chico não se envergonha de participar é o programa "Esta Noite se Improvisa", também da TV Record, onde alterna com Caetano Veloso o primeiro lugar no conhecimento de letras de músicas brasileiras.
Estréia como ator no cinema, ao lado de Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Nara Leão e Ronnie Von, no filme "Garota de Ipanema", de Leon Hirszman, interpretando ele mesmo. "Carolina" fica em terceiro lugar no II FIC - Festival Internacional da Canção - promovido pela Rede Globo. "Roda Viva" também se classifica em terceiro no III Festival da MPB, promovido pela TV Record.
Diversos artistas, entre eles, Gilberto Gil, Elis Regina, Jair Rodrigues e os integrantes do MPB-4 organizam, em São Paulo, uma passeata contra a presença da guitarra elétrica na música brasileira, mas Chico não participa. Escreve a peça "Roda Viva". Em meio a inúmeros shows pelo Brasil, grava seu segundo LP, "Chico Buarque de Hollanda, Volume 2". Em 1968, participa, no Rio de Janeiro, da "Passeata dos Cem Mil", que reuniu estudantes, artistas e intelectuais em um protesto contra a ditadura militar. "Bom Tempo", considerada por muitos uma composição em descompasso com o clima político de então, fica em segundo lugar na Bienal do Samba. A canção "Benvinda", a despeito das vaias, vence o IV Festival da MPB da Record. Um comando do CCC - Comando de Caça aos Comunistas - invade o teatro Galpão, em São Paulo, depreda as instalações e espanca atores e técnicos da montagem de "Roda Viva". Sob as vaias do público do Maracanãzinho, vence o Festival Internacional da Canção, com "Sabiá", feita em parceria com Tom Jobim, com quem compõe, no mesmo ano, "Pois É" e "Retrato em Branco e Preto". A imprensa publica notícias sobre o confronto de idéias entre Chico e os tropicalistas, cuja linguagem musical propunha, de certa forma, um rompimento estético com o belo. Para Caetano Veloso, Chico continuava fazendo "só o que era bonito, enquanto nós queríamos também uma coisa que fosse, de algum modo, feia". Em dezembro, publica na Última Hora, de São Paulo, o artigo intitulado "Nem toda loucura é genial, nem toda lucidez é velha", respondendo às críticas que lhe eram feitas por seu apego ao samba tradicional.
Chico em Copacabana
Dias após a decretação do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro, é detido em sua própria casa e levado ao Ministério do Exército para prestar depoimento sobre a sua participação na "Passeata dos Cem Mil" e sobre as cenas exibidas na peça "Roda Viva", consideradas subversivas. Com autorização de um certo coronel Átila, a quem deveria solicitar permissão sempre que saísse da cidade, deixa o Brasil em janeiro de 1969 e se apresenta na grande Feira da Indústria Fonográfica, em Cannes, na França. Parte depois para um auto-exílio na Itália. Apesar de "A Banda" estar nas paradas de sucesso na voz da cantora popular italiana Mina, Chico lança na Itália, com pouco sucesso, dois LPs. Depois de uma temporada de dificuldades financeiras, fecha, no final do ano, um contrato com a Philips para o lançamento de um novo disco, o que lhe rende 90 mil cruzeiros novos (o equivalente a 21.400 dólares da época) e lhe garante a sobrevivência no exílio. Convida Toquinho para acompanhá-lo em shows na Itália, fazendo a parte inicial do show que abria os espetáculos da turnê da veterana Josephine Baker. E "nessa temporada de duração um tanto forçada" (versos de Vinicius vetados pela censura), coloca letra em "Samba de Orly" ,que Toquinho lhe mostra como uma espécie de bilhete de despedida no dia em que decidiu retornar ao Brasil. O contato com Garrincha, além do prazer de poder falar sobre música e futebol com um craque, lhe confere popularidade e respeito no bar próximo de sua casa em Roma. Escreve artigos esporádicos para o semanário político-satírico "O Pasquim", um dos marcos do jornalismo brasileiro da época. Seu retorno ao Brasil em 1971 é marcado pelo "barulho" organizado por recomendação de Vinicius de Moraes: muita gente o esperando no aeroporto, manifestações de amigos, entrevistas à imprensa e um show marcado na boate Sucata para lançar seu quarto LP, um disco de transição, gravado em circunstâncias complicadas. Afasta-se do samba tradicional, variando mais a linha das composições e revelando novas influências como a toada, em "Rosa dos Ventos", até o iê-iê-iê italiano em "Cara a Cara". A mudança se reflete também nas letras, nas quais ele parece desvencilhar-se explicitamente do lirismo nostálgico e descompromissado que antes parecia identificá-lo. Compõe "Apesar de Você", uma resposta crítica ao regime ditatorial no qual o país ainda estava imerso. Surpreendentemente, a música passaria incólume pela censura prévia e se tornaria uma espécie de hino da resistência à ditadura. Depois de vender cerca de 100 mil cópias, a canção é censurada, o disco é retirado das lojas e até a fábrica da gravadora é fechada. Para o público, não havia dúvidas: o "você" da música era o general Emílio Garrastazu Médici, então presidente da República, em cujo governo foram cometidas as maiores atrocidades contra os opositores do regime. Ao ser interrogado sobre quem era o "você" da canção, Chico responde: "É uma mulher muito autoritária". Após este episódio, o cerco às suas composições endurece. Participa do Circuito Universitário, com shows promovidos pelos centros acadêmicos das universidades por artistas com dificuldades em mostrar seu trabalho nos meios de comunicação. Ao lado, entre outros nomes, do arquiteto Oscar Niemeyer, do editor Ênio Silveira e de seu próprio pai, participa do Conselho do Cebrade - Centro Brasil Democrático - organização de intelectuais publicamente comprometidos com a luta contra a ditadura. A aproximação com o Cebrade lhe valeria, durante bom tempo, o rótulo de membro da "linha auxiliar" de um dos dois partidos comunistas brasileiros, o PCB, pró-Moscou. Em abril de 1971, é vetado integralmente pela censura, seu samba "Bolsa de Amores", composto como brincadeira para Mário Reis, um aplicador contumaz das Bolsas de Valores. A alegação: a letra era ofensiva à mulher brasileira. O LP sai com uma faixa a menos que as doze habituais.
Dois gênios da MPB, Chico e Tom Jobim
Rompe com a TV Globo e cancela sua inscrição, junto com outros convidados, no VI Festival Internacional da Canção, em sinal de protesto contra a censura e a tentativa de se utilizar o festival como veículo de propaganda a serviço da ditadura. Desafia mais uma vez seu lado ator no filme "Quando o Carnaval Chegar", de Cacá Diegues, vivendo o protagonista, ao lado de Nara Leão e Maria Bethânia, em 1972. Compõe quase todas as músicas do filme. Voltaria a fazer músicas para mais dois filmes de Cacá Diegues: "Joanna Francesa", em 1973, e "Bye Bye, Brasil", de 1979. Traduz, com Ruy Guerra, o musical "O Homem de la Mancha". São deste ano as músicas "Sonho Impossível", "Partido Alto", "Bom Conselho" e "Atrás da Porta", entre outras. Escreve, em 1973, com Ruy Guerra, a peça "Calabar", ou "O Elogio da Traição", cuja ação se passa no Brasil Colônia, onde é relativizada a posição de Domingos Fernandes Calabar que preferiu o invasor holandês ao colonizador português. Proibida pela censura, a peça somente seria liberada muito anos depois. A música "Cálice", feita em parceria com Gilberto Gil, é proibida. Desta vez não pela censura (que já havia vetado a letra), mas pela própria Phonogram. Com medo de represálias, a gravadora desliga os microfones do palco e impede Chico e Gil até mesmo de tocarem a melodia sem letra. O episódio contribuiria, mais tarde, para o rompimento do compositor com a gravadora. Lança o jogo "Ludopédio" - criado durante o período que passou na Itália - uma brincadeira com times de futebol, rebatizado de "Escrete", em 1982. A censura proíbe a capa do disco "Chico Canta Calabar", com as músicas da peça. Resiste às tentativas dos que querem transformá-lo em um símbolo da luta política contra o regime militar. Faz com Maria Bethânia uma longa temporada de shows no Canecão, Rio de Janeiro. A letra de "Tanto Mar", uma saudação à Revolução dos Cravos - que depusera a ditadura salazarista em Portugal - é proibida pela censura e Chico grava um compacto em Portugal incluindo a canção aqui proibida. Anos depois a música seria liberada, mas Chico refaz a letra em função dos rumos tomados pela revolução portuguesa.
Fica nove anos sem encarar profissionalmente um palco, limitando-se a participar de eventos em benefício de causas sociais, como os shows de 1º de Maio, promovidos pelo Centro Brasil Democrático (Cebrade). Escreve, em parceria com Paulo Pontes, a tragédia "greco-carioca" "Gota d'Água", uma releitura de Medéia, de Eurípedes, baseada em adaptação que Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, havia feito para a televisão. A peça se torna um dos maiores sucessos de crítica e público. Ganha o Prêmio Molière como melhor autor teatral pelo seu trabalho em "Gota d´Água". Em protesto contra a censura, que proibira peças de vários autores, não comparece à cerimônia de entrega dos prêmios. Compõe "Vai Trabalhar, Vagabundo" para o filme homônimo, dirigido por Hugo Carvana. Em 1976, compõe "O Que Será", para o filme "Dona Flor e Seus Dois Maridos", de Bruno Barreto. Por tê-la composto, depois de ver uma coleção de fotos de Cuba, feitas pelo jornalista e escritor Fernando Morais, diz que a música é um "cubaião", mistura de Cuba com baião. Sai o disco "Meus Caros Amigos". Após seis anos distante de qualquer tipo de programação realizada nos estúdios da TV Globo, sua canção "Maninha", é incluída na trilha sonora da novela "Espelho Mágico" em 1977. A partir de então, várias outras músicas suas seriam utilizadas como temas de novelas da Globo. Compõe "Feijoada Completa" para o filme "Se Segura, Malandro", de Hugo Carvana. Escreve o texto e compõe as canções da peça "Ópera do Malandro", dirigida por Luis Antônio Martinez Corrêa. Em fevereiro de 1978, vai à Cuba pela primeira vez, como jurado do Prêmio Literário da Casa de las Américas. Faz uma versão para a música "Canción por la Unidad Latinoamericana", de Pablo Milanés. Entra em contato com Pablo Milanés, Silvio Rodriguez e outros nomes da "Nueva Trova" cubana, iniciando um processo de aproximação cultural entre os dois países que redundaria no reatamento das relações diplomáticas em 1986. Ao voltar ao Brasil, é detido pelo DOPS junto a mulher, Marieta. O mesmo aconteceria com Antonio Callado e Fernando Morais, seus colegas de júri em Cuba. Todos são obrigados a prestar depoimentos sobre a viagem à ilha. Estréia a peça "Ópera do Malandro". Inaugura o "Centro Recreativo Vinicius de Moraes", no Rio de Janeiro, local onde joga regularmente suas peladas e disputa campeonatos pelo Politheama.
Lança o disco "Chico Buarque" em 1978. Em 1979, compõe diversas músicas para cinema (para "República dos Assassinos", de Miguel Faria Jr., faz "Sob Medida" e "Não Sonho Mais"; para "Bye Bye, Brasil", de Cacá Diegues, a música de mesmo nome) e teatro ("Dueto", para a peça "O Rei de Ramos", de Dias Gomes). Lança "Chapeuzinho Amarelo", o primeiro livro infantil de sua autoria, ilustrado por Donatella Berlendis. "Calabar" é finalmente liberada pela censura e estréia em São Paulo em 1980. É lançado o álbum duplo "Ópera do Malandro". Em 1980, fecha contrato com a gravadora Ariola, após doze anos de Polygram. Por ironia do destino, a própria Polygram compraria a Ariola no ano seguinte.
A pedido da bailarina Marilena Ansaldi, faz as músicas para a peça "Geni". Participa da festa do Avante, órgão oficial do Partido Comunista Português, e do projeto Kalunga, em Angola, onde se apresenta, com mais 64 artistas brasileiros, por todo o país. A renda dos shows é destinada à construção de um hospital. O cineasta argentino Maurício Berú realiza o documentário "Certas Palavras", sobre Chico Buarque, com participação - em números especiais ou depoimentos - de Caetano Veloso, Maria Bethânia, Vinícius de Moraes (que é filmado pela última vez), Toquinho, Francis Hime, Ruy Guerra, Miúcha, Sérgio Buarque de Hollanda e outros amigos e familiares. Ainda em 1980, faz duas músicas para a peça "O Último dos Nukupirus", de Ziraldo e Gugu Olimecha. Lança o disco "Vida", que traz, entre outras, a música "Eu te Amo", feita especialmente para o filme homônimo de Arnaldo Jabor. Em 1981, participa, juntamente com Sérgio Bardotti, Antônio Pedro e Teresa Trautman, do roteiro de uma produção milionária: o filme "Saltimbancos Trapalhões", estrelado pelos Trapalhões. Após 17 anos na gaveta, o livro "A Bordo do Rui Barbosa", poema escrito entre 63 e 64, é publicado com ilustrações do amigo Valandro Keating.
Lança os discos "Almanaque" e "Saltimbancos Trapalhões". Em parceria com Edu Lobo, no ano de 1982, compõe as canções para o balé "O Grande Circo Místico", que seria lançado em disco no ano seguinte. Morre Sérgio Buarque de Hollanda, aos 79 anos de idade. Entre 1983 e 1984, faz, com o cineasta Miguel Faria Jr., a adaptação e o roteiro para o filme "Para Viver um Grande Amor" e participa ativamente da campanha pelas "Diretas Já", para presidente da República. Trabalha na elaboração do roteiro e compõe novas canções para o filme "Ópera do Malandro", de Ruy Guerra, baseado em sua peça, em 1985. Com Edu Lobo, compõe as músicas para a peça "O Corsário do Rei", de Augusto Boal. Comanda em 1986, ao lado de Caetano Veloso, o programa de televisão "Chico e Caetano", que permaneceu por sete meses na programação da Rede Globo, reunindo nomes expressivos da Música Popular Brasileira, além de estrelas internacionais. Compõe "As Minhas Meninas" para a peça "As Quatro Meninas" e, finalmente, coloca letra na canção "Anos Dourados", uma parceria com Tom Jobim, encomendada pela Globo para ser o tema musical da minissérie de mesmo nome. A minissérie havia ido ao ar com a canção sem a letra porque Chico demorou a escrevê-la, ou como disse numa entrevista "a minissérie é que foi precipitada". Em 1987 lança o disco "Francisco" e volta aos palcos dirigido por Naum Alves de Souza. Em 1988, compõe com Edu Lobo as canções para o balé "Dança da Meia-lua". Compõe "Trapaças", para o filme "Amor Vagabundo", de Hugo Carvana, em 1989, onde faz uma ponta interpretando sua própria criação, "Julinho da Adelaide". A editora Companhia das Letras publica o songbook "Chico Buarque Letra e Música", com prefácios de Tom Jobim e Eric Nepomuceno, e o texto "Gol de Letras", de Humberto Werneck. Lança o disco "Chico Buarque". Lança seu primeiro romance em 1991, "Estorvo", publicado pela Companhia das Letras, com o qual ganha o "Prêmio Jabuti de Literatura". Os direitos de publicação de "Estorvo" são rapidamente vendidos para sete países: França, Itália, Inglaterra, Alemanha, Espanha, Estados Unidos e Portugal. Neste último, a venda atingiu 7.500 exemplares em apenas três dias, surpreendendo a Editora Dom Quixote. Sobe aos palcos, em janeiro de 94, para fazer o show do disco "Paratodos", lançado no final de 93 e que é recebido com grande expectativa depois de um jejum de quatro anos sem gravar. Participa da "Campanha Nacional Contra a Fome e Pela Cidadania", do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Escreve o segundo romance, "Benjamim", que, lançado em 1995, recebe críticas desfavoráveis de parte da crítica literária, não obstante o sucesso de vendas e os elogios de grandes nomes da literatura.
Nasce, no dia 24 de agosto de 1996, no Rio de Janeiro, o neto Francisco Buarque de Freitas, filho de sua filha Helena Buarque e do músico baiano Carlinhos Brown. Participa da "Campanha pela Paz no Futebol". Participa, em 1997, do disco "Chico Buarque de Mangueira", com regravações de clássicos dos compositores da escola e com uma composição inédita sua, em parceria com Hermínio Bello de Carvalho: "Chão de Esmeraldas". Com duas canções inéditas ("Levantados do Chão" e "Assentamento") e duas regravações ("Brejo da Cruz" e "Fantasia"), grava um CD para o livro "Terra", do fotógrafo Sebastião Salgado, publicado com texto do escritor português José Saramago. O trabalho foi lançado no dia 17 de abril, véspera do aniversário do massacre de trabalhadores sem-terra em Eldorado dos Carajás, região Norte do Brasil. É o homenageado no desfile em que a Mangueira sagrou-se campeã do carnaval de 1998. De Paris, escreve artigos para os jornais O Estado de S. Paulo e O Globo durante a Copa do Mundo. O álbum "As Cidades", com sete canções inéditas e quatro regravações, chega às lojas cinco anos depois de "Paratodos". É seu primeiro trabalho lançado na Internet. Durante um ano, em 1999, percorre o Brasil com o show "As Cidades". Segue em turnê pelo exterior, apresentando-se na Argentina, Uruguai, Portugal, França, Inglaterra e Itália. O espetáculo é um sucesso absoluto de público e crítica. Chico canta e toca dez das onze músicas do disco homônimo, além de canções consagradas como "Vai Passar", "O Meu Amor" e "Construção". Encerra a temporada de "As Cidades" empolgado com o resultado e a qualidade dos shows. Decide, então, lançar "Chico ao Vivo", um álbum duplo com 29 músicas. O trabalho é o seu quarto CD ao vivo. Os quatro anteriores foram: "Caetano e Chico Juntos e ao Vivo"; "Chico Buarque e Maria Bethânia ao Vivo"; "Melhores Momentos de Chico e Caetano"; e "Chico ao Vivo - Paris Le Zenith".
No ano de 2000, o filme "Estorvo", de Ruy Guerra, concorre à Palma de Ouro do 53º Festival Internacional de Cinema de Cannes. Baseado em romance homônimo de Chico, é uma co-produção de Brasil-Cuba-Portugal. Traz no elenco o cubano Jorge Perugorría e os brasileiros Bianca Byington, Leonor Arocha e Tonico Oliveira. A versão cinematográfica de "Estorvo" marca mais uma parceria de Ruy Guerra e Chico. Eles já haviam trabalhado juntos na peça "Calabar" e na adaptação para o cinema do musical "A Ópera do Malandro". Em 2001 faz as letras para as canções de Edu Lobo para a peça "Cambaio", de Adriana e João Falcão. Sai em 2002, pela BMG o disco "Duetos", que reúne 14 das mais de 200 participações de Chico cantando com outros artistas. Neste disco participam Elza Soares, Mestre Marçal, Ana Belém, Nara Leão, Zeca Pagodinho, Sergio Endrigo, Nana Caymmi, Johnny Alf, Pablo Milanés, João do Vale, Dionne Warwick, Miúcha, Tom Jobim e Elba Ramalho. É lançada também a caixa "Construção", que reúne em CD os álbuns publicados entre 1966 e 1985 e traz de bônus um CD com 19 outras canções, em sua maior parte, duetos com outros artistas (Elis Regina, Fagner, Toquinho, Nara Leão, Milton Nascimento, Djavan, MPB 4, Pablo Milanés, Trio Esperança, Quarteto em Cy e Zizi Possi). Em 2003, chega aos cinemas o filme "Benjamim", dirigido por Monique Gardenberg, e que tem no elenco Paulo José, Cléo Pires, Danton Mello e Chico Diaz. A Cia. das Letras publica "Budapeste", seu terceiro romance. O livro fica na lista dos mais vendidos por diversos meses e, na seqüência, é traduzido para mais de 6 idiomas. O documentário "Chico" ou "O País da Delicadeza Perdida", do selo Videofilmes Produções Artísticas, com direção de Walter Salles e Nelson Motta, sai em DVD.
O mais recente disco: "Chico"
Em seu mais recente disco, intitulado "Chico", lançado em 22 de julho deste ano, ele apresenta dez canções delicadas e suaves, entre blues, valsa, baião e samba, que mostram a sua poesia e as suas crônicas sobre as suas inquietudes e os relacionamentos amorosos. São elas: Querido diário, Rubato, Essa pequena, Tipo um baião, Se eu soubesse, Sem você 2, Sou eu, Nina, Barafunda e Sinhá.
Desde 2006 sem se apresentar ao vivo, Chico finalmente volta aos palcos na turnê do seu mais novo disco, iniciando por Belo Horizonte, onde se apresentou no Palácio das Artes, nos dias 5 a 9 de novembro. Depois segue para Porto Alegre (Teatro Sesi, 28 e 29 de novembro), Curitiba (Teatro Guaíra, de 15 a 18 de dezembro), Rio de Janeiro (Vivo Rio, datas a confirmar entre 5 e 29 de janeiro) e São Paulo (HSBC Brasil, datas a confirmar entre 1 e 25 de março). Outras cidades deverão ser acrescentadas ao roteiro. Informações sobre datas e ingressos serão divulgadas em breve. A banda que acompanha o cantor é capitaneada pelo maestro, arranjador e violonista Luiz Cláudio Ramos e conta ainda com João Rebouças (piano), Bia Paes Leme (teclados e vocais), Wilson das Neves (bateria), Chico Batera (percussão), Jorge Hélder (contrabaixo) e Marcelo Bernardes (flauta e sopros).
Fonte: chicobuarque.com.br


Eu gostaria muito de publicar aqui uma dezena de vídeos de clássicos da obra de Chico Buarque para o conhecimento dos que ainda não conhecem o seu trabalho, mas infelizmente é inviável. Publicarei então apenas algumas músicas do seu mais recente álbum, simplesmente intitulado "Chico". 






Um comentário:

Lelo disse...

Sinto muita saudades, não do regime militar, mas sim, das composições e músicas de Chico Buarque contra a ditadura da época, bons momentos de rebeldia e romantismo e Chico nos mostrava com suas letras as crueldades, a lei da mordaça, as torturas, os desaparecimentos etc. mas também nos ensinava como protestar, como lutar para demogratização do país, principalmente junto aos universitários. Não tenho dúvida de que Chico foi um dos grandes colaboradores e responsável para queda do militarismo.