Este modesto nosso blog foi criado especificamente para falar de Espinosa e da sua gente calorosa, festiva e solidária. Ele não foi imaginado para falar de minha pessoa e da minha vida, exatamente. Porém, às vezes, pessoas e fatos da minha amada Espinosa também me incluem no roteiro e assim não posso me furtar a não contá-las aqui. Este curto preâmbulo é apenas para pedir permissão a vocês para eu poder contar um fato bem pessoal e que me veio à memória quando, ao organizar meu acervo de fotografias, me deparei com a fotografia da minha Tia Izaura.
Minha vida de criança, adolescente e jovem foi vivida em grande parte na Rua da Resina e no Rio São Domingos, ali bem pertinho. O rio era o nosso playground natural, aberto, amplo, livre, democrático, ainda não tristemente poluído. Era lá que ficávamos o tempo quase todo, depois do horário da escola. Muitas das nossas brincadeiras tinham o rio e sua vegetação como base e muitos dos nossos brinquedos eram fabricados por nós mesmos com materiais retirados dali. Meu saudoso amigo Negão, José Valite na certidão de nascimento, era o nosso gênio da criação. Ele era certamente o mais inventivo de toda nossa turma da Resina. Se a minha memória não me trai, foi ele, principalmente, e mais outros, que montaram um balanço na beira do rio. Utilizando de uma grande árvore, abundantes naqueles bons tempos de outrora, eles juntaram dois longos pedaços de corda com uma peça retangular de madeira e fabricaram um balanço. O brinquedo ficou ótimo e bastante alto, pendente do alto da árvore, o que aumentava a sensação de perigo e a adrenalina.
Depois de montada e testada com êxito, a nossa mais nova fonte de diversão foi imediatamente disputada por todos. Todo mundo queria dar uma balançadinha, claro. Então nos revezávamos no balanço até que a manhã terminou e chegou a hora do almoço. Fomos para casa. Com imensa ânsia de retornar logo e aproveitar ao máximo o mais novo passatempo, engoli a comida rapidamente e retornei correndo para a beira do rio. Saí de casa na Rua da Resina, cheguei até a esquina das casas de Madrinha Judith, Dona Zulmira e seu Vavá e desci a Rua Arthur Bernardes. Atravessei o rio com muita areia e pouca água e "ponguei", como fazíamos nos carros de bois comuns naqueles tempos, no banco do balanço, com uma imensa sensação de prazer e alegria incontida. Estava eu sozinho ali, sentindo-me o mais feliz dos meninos do mundo, pois o balanço era todinho meu. Mas algo deu errado.
Entusiasmado demais com o brinquedo, balancei cada vez mais forte, enquanto aumentava a sensação de satisfação. Aí o mundo começou a girar repentinamente e tudo escureceu. Senti o baque surdo do meu corpo pequeno e magro na terra arenosa da beira do rio e um diminuto filete de sangue quente no meu pescoço. Eu não conseguia me mexer e só via as águas do rio passando diante dos meus olhos, bem pertinho. Não me lembro de mais nada. Não tenho até hoje noção de quanto tempo fiquei ali caído, praticamente desacordado. E aí veio a salvação!
Por mais que o destino tenha sido cruel comigo em alguns momentos, não posso reclamar de Deus. O meu Deus sempre esteve ao meu lado e me salvou em inúmeras situações de perigo. Naquele exato momento de risco à minha vida, Deus fez com que Tia Izaura estivesse visitando minha Mestra Dona Nair de João Meira ali na Rua da Resina. Ao passar pelo quintal da casa, Tia Izaura visualizou de longe aquele corpo de menino, caído à beira do rio. Imediatamente ela cruzou o quintal, desceu o barranco até o rio e me socorreu, levando-me para minha casa. Na queda, eu havia caído em cima de um toco no chão e este perfurou o meu pescoço, sem muita gravidade. Fui medicado rapidamente e fiquei um tempo em isolamento social, afastado das brincadeiras com os amigos. Mas vivo, graças a Deus e à minha Tia Izaura.
Por essas inexplicáveis coisas da vida da gente, nunca tive muita intimidade com Tia Izaura. As tias que mais me aproximo, sempre em contato, são Tia Lia e Tia Cleide. Até tento manter contato com as demais quando estou em Espinosa, mas é meio complicado, pois tenho receio de ir visitá-las em horário indevido e incomodá-las por isso. Houve um ano em que consegui, com a ajuda do meu primo Vasco, visitar algumas delas, como Tia Alice e Tia Maria. Espero que logo que puder retornar a Espinosa, eu possa visitar todas e demonstrar meu respeito e carinho por elas. Principalmente visitar Tia Izaura e agradecê-la muito por ter me salvado a vida! Ela sempre terá minha gratidão, meu carinho e minhas orações. Que assim seja!
Um grande abraço espinosense.