O peculiar modo de falar do povo do nosso Sertão é um tesouro incomensurável. Denominado "Linguajar Catrumano", o assunto virou música de um dos mais importantes artistas populares do Brasil, o Teófilo de Azevedo Filho, ou o conhecido poeta, escritor e músico Téo Azevedo, em parceria com Braúna.
Nascido em 02 de julho de 1943 no distrito de Alto Belo, na cidade de Bocaiuva, Téo Azevedo é um artista múltiplo, atuando com todo seu talento como compositor, cantor, declamador, cordelista, escritor, folclorista, músico, produtor fonográfico, radialista, repentista e violeiro, sempre defendendo com unhas e dentes a cultura popular de imenso valor do Norte de Minas. E não só! Téo luta bravamente pela preservação da Natureza do Sertão, do Rio São Francisco e demais cursos d´água da região tão massacrada pela seca e pelos ignorantes devastadores e poluidores do Meio Ambiente.
Téo começou cedo sua trajetória brilhante na cultura popular. O filho de Teófilo Izidoro de Azevedo, o "Seu Tiófo" e Clemência Cristina de Azevedo, a Dona Quelé, fez de tudo um pouco na vida dura de pobreza. Após a morte do pai por febre tifoide, teve que ajudar Dona Quelé a sustentar os outros seis irmãos. Já morando em Montes Claros, trabalhou como carregador de malas, vendedor de frutas e engraxate. Nesta última função, fazia uso do repente para atrair os fregueses, o que atraiu a atenção do pernambucano Antônio Salvino, um camelô que perambulava pelo Norte de Minas e Sul da Bahia vendendo remédios caseiros à base de ervas. A parceria durou até a aposentadoria forçada do amigo e parceiro por conta de um acidente de trânsito quando viajavam na Bahia em cima de uma carroceria de caminhão, coisa rotineira naqueles tempos duros. Por conta dessa situação de ter sido obrigado pelas circunstâncias de trabalhar desde pequeno, só concluiu o ensino primário, o que não o impediu de se tornar escritor e criador incessante de cordéis e canções. A literatura de cordel ainda o sustentou por anos, vendida em feiras na capital mineira. Para sobreviver, Téo ainda se virou como lutador de boxe, integrante do Exército, repentista nas ruas, catador de papel, engraxate, pintor de letras, integrante de grupo musical e crooner. Sua carreira de cantador violeiro, como humildemente se define, iniciou-se efetivamente em São Paulo com o lançamento do seu primeiro LP, "Brasil, Terra da Gente", em 1979. Depois viriam muitos mais, cerca de 25, entre LPs e CDs, individuais ou em participações especiais. Admirador de Luiz Gonzaga, o "Rei do Baião", lançou em 2012 o CD "Salve 100 anos Gonzagão", em comemoração do centenário do nascimento do artista nordestino, o que lhe valeu a premiação com o Grammy Latino na categoria "Melhor Álbum de Raiz".
Téo Azevedo é um gigante no cenário da cultura popular do Brasil, lutando incessantemente por ela mesmo com toda a dificuldade em um país que não valoriza como deveria a obra de seus artistas do povo. Ele não só construiu um tesouro musical com suas composições próprias ou com seus muitos parceiros, como foi fundamental no descobrimento e divulgação de muitos artistas então desconhecidos, como o Zé Coco do Riachão, de quem produziu o primeiro disco. Téo Azevedo merece toda a glória, respeito e reconhecimento pelo seu importantíssimo trabalho no panorama da cultura brasileira.
Um grande abraço espinosense.
A Seca (linguajar catrumano)
No ano qui a chuva cai
Lá no meu norte mineiro
Chuva dentro dos conforme
Sem aquele aguaceiro
A fartura é de montão
É fava, mio e feijão
E fica alegre o rocero
Melancia de fartura
Da matuta bem rajada
Intoncebera de rio
Daquela outra pintada
O miolo vermeinho
Com um cardo bem docinho
Qui eu chupo dez taiada
Com a chuva se tem tudo
Do maxixe ao quiabo
Mais que vê o trem bem feio
Não existe homi brabo
Uma seca no Sertão
Parecia coisa de cão
Mandada pelo diabo
[…] (AZEVEDO, 2003, p. 19)