Espinosa, meu éden

Espinosa, meu éden

segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Centenário de Espinosa - Postagem 28

Para comemorar o Centenário de Espinosa da sua emancipação política, publicarei aqui no nosso blog 100 (CEM) textos específicos (além das postagens normais), sobre imagens, acontecimentos e "causos" sobre mim, a minha Espinosa e alguns dos seus notáveis personagens.

Sêo Aristides José Tolentino era um homem rico, muito rico. Era um espinosense cidadão milionário com espírito empreendedor. Não contente em possuir grana no banco, boa casa e carro novo, além de uma fonte gigantesca de lucro na sua algodoeira, ele se aventurou em dois grandes investimentos na cidade, um, o imenso hotel na Rua Dom Lúcio, e o outro, o moderno e amplo cinema na Praça Antonino Neves. Sobre o hotel, falo em outra postagem. Sobre o Cine Coronel Tolentino, foi uma dádiva aos que apreciavam a arte e a cultura na cidade interiorana, bem distante das capitais mineira e baiana. O cinema era maravilhoso, uma coisa mágica, principalmente para mim, durante a infância e adolescência. Construído de forma desafiadora no terreno alagado da lagoa, com bases bem fincadas que resistem bravamente até os dias atuais, o prédio continha o melhor maquinário disponível na época e instalações modernas e confortáveis. Os projetores eram de última geração, as poltronas eram acolchoadas, as cortinas eram grossas e compridas, a sala de espera era limpa, agradável e espaçosa, com bomboniere, e a projeção na tela grande era em cinemascope. Com tamanha modernidade e conforto, o cinema ainda nos encantava com as fotografias e cartazes dos filmes por estrear, exibidos na sala de espera. Um diferencial encantador era a série de luzes coloridas no teto, que piscavam alternadamente no momento em que era tocado o tema de abertura do Cine Coronel Tolentino, a belíssima "Sinfonia n.º 40 em Sol Menor" do genial Wolfgang Amadeus Mozart, composta em 1788. É só escutar esta maravilha que minh´alma se teletransporta imediatamente para aquele passado gostoso em que eu, encantado, viajava no tempo e no espaço da imaginação provocada pela magia do cinema.







Se há uma coisa boa do passado em Espinosa e que me dá imensa saudade, é o cinema. Ali dentro daquele imenso prédio, vivi emoções formidáveis, envolvendo-me profundamente nas histórias e aventuras de personagens como Tarzan, Sansão, Os Trapalhões, Mazzaropi, Django, Sartana e outros heróis e bandidos da ficção. Era bom demais também ver as imagens do Canal 100, sobretudo as do futebol brasileiro. Lembro-me que guardávamos como tesouros os pedacinhos de fita de imagens dos filmes que eram descartados pela janela lateral que hoje dá para a sede da APAE. É uma pena que os cinemas tenham perdido tanto espaço no país, hoje encaixotados em salas de shopping e com preços altos, bem inacessíveis para a grande maioria da população.
Para finalizar, uma descoberta que me surpreendeu. Imaginava eu que o prédio da Cotesp havia sido construído após o do cinema, mas como mostra inapelavelmente a velha fotografia, estava eu totalmente enganado. Nunca é tarde para descobrir a realidade dos fatos. 
Um forte, imenso e centenário abraço lençóisdorioverdense.

Centenário de Espinosa - Postagem 27

Para comemorar o Centenário de Espinosa da sua emancipação política, publicarei aqui no nosso blog 100 (CEM) textos específicos (além das postagens normais), sobre imagens, acontecimentos e "causos" sobre mim, a minha Espinosa e alguns dos seus notáveis personagens.

Nos tempos antigos era bastante difícil a locomoção das pessoas em percursos médios e mais longos, já que carros e motocicletas eram artigos de luxo apenas acessíveis aos ricos. Transporte diário por ônibus ainda era inexistente. Umas das poucas opções de deslocamento para os menos favorecidos pela sorte eram o cavalo e a bicicleta. Outra possibilidade de viagem disponível para grupos de pessoas era nos caminhões, que transportavam a população em cima da carroceria. Alguns dos viajantes iam sentados em bancos de madeira encaixados nas laterais da carroceria, os demais iam em pé mesmo, desconfortavelmente instalados, correndo sério risco de cair do veículo. Esse modelo adaptado de transporte de pessoas, mesmo desconfortável e perigoso, foi de fundamental importância para o desenvolvimento do país, com brasileiros do Nordeste, principalmente, deslocando-se por centenas de quilômetros com suas famílias em direção ao Sudeste em busca de empregos e da melhoria de vida para suas famílias.
"Não adianta ir embora,
pra São Paulo ou Guanabara,
o patrão que aqui me explora,
me arranca os olhos da cara,
é o mesmo patrão de lá,
e o Deus de lá é o daqui,
só deixo meu Cariri,
no último pau de arara..."
O sistema de transporte denominado de pau de arara, que também dá nome ao modo de transporte de aves para venda na feira e a uma terrível tática de tortura bastante utilizada durante a brutal ditadura militar brasileira, foi eternizado na história musical do Brasil na canção "O Último Pau de Arara", poema do poeta paraibano José Palmeira Guimarães musicado pela dupla Venâncio e Corumba (Marcos Cavalcanti de Albuquerque e Manoel José do Espírito Santo, respectivamente) no ano de 1956. Na famosa canção gravada por Luiz Gonzaga e Raimundo Fagner e que se tornou enorme sucesso, estes versos acima foram censurados.






Na nossa Espinosa os caminhões e picapes eram muito utilizadas no transporte de passageiros, devido à inexistência de ônibus e automóveis para esta travessia à época. Meu falecido pai utilizava o seu caminhão Ford para fazer, aos sábados de feira, o transporte de pessoas de Espinosa para o Estreito na década de 60 e 70. Era comum a utilização desses veículos para levar trabalhadores, conduzir pessoas para passeios nos rios e fazendas da região, realizar romarias na cidade turística baiana de Bom Jesus da Lapa e no transporte de jogadores para jogos em outras cidades circunvizinhas. 
Viajei muito na carroceria da C-10 da Prefeitura dirigida pelo saudoso Sêo Ezinho, pai de Tatuzinho, para jogar bola pelo Cruzeirinho em cidades do Norte de Minas e Sudoeste da Bahia. Era um sofrimento. E influenciava negativamente no nosso desempenho em campo, já que chegávamos cansados ao destino, pouco tempo antes do início das partidas. Após os jogos então, era ainda mais sofrimento, pois além do desconforto com a estrada irregular, do espaço restrito, da poeira e do frio, tínhamos que suportar as fortes câimbras. Se alguém tem saudade dessa tortura, eu não! Prefiro ir em estrada asfaltada em boas condições, de carro ou ônibus confortáveis, sem sol na cabeça, sem calor escaldante, sem poeira e com espaço para esticar as pernas. Afinal de contas, saudosismo tem limite.    
Ao longo do tempo as coisas melhoraram bastante, com mais opções e melhores, mais confortáveis e seguras condições de locomoção. Até a Lei foi alterada, proibindo o transporte de passageiros em compartimento de carga, conforme o artigo 230 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), configurando infração gravíssima (sete pontos na CNH), gerando multa (R$ 293,47), apreensão e remoção do veículo. Evoluir é sempre necessário. Era divertido, era, não há como negar. Mas havia riscos à vida, como aconteceu no acidente nos anos 80 que tirou tragicamente a vida da menina Tuka. que morava com a minha Tia Lia. A vida deve sempre ser preservada, e a prevenção é o melhor remédio.
Um forte, imenso e centenário abraço lençóisdorioverdense.