Espinosa, meu éden

Espinosa, meu éden

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

2085 - A magnífica erupção do "Vesúvio" de Djavan

As melodias muitíssimo bem elaboradas, os versos transbordantes de poesia pura, a voz afinadamente cristalina, as interpretações serenas e tocantes ao coração, os arranjos brilhantemente confeccionados, a música em estado puro de encantamento e sofisticação, é o retorno de Djavan ao disco. O alagoano é (alvíssaras!) um dos poucos artistas deste país que tem a coragem, o talento e a autoridade de enfrentar a potente correnteza do tsunami de insignificância que impera no cenário musical brasileiro nesses tempos sombrios de retrocesso e aridez criativa.



O cantor, compositor e músico Djavan estará completando 70 anos no próximo 27 de janeiro. São mais de 45 anos de estrada na música, com clássicos da música popular brasileira criados para sempre djavanear os corações sensíveis dos amantes da canção.
O 24º álbum de Djavan, intitulado "Vesúvio", foi lançado pela sua gravadora Luanda Records hoje, 23 de novembro, trazendo 12 canções inéditas, todas de sua autoria, e como bônus a gravação de uma versão de música sua ao lado do talentoso artista uruguaio Jorge Drexler, premiado recentemente no Grammy Latino. A foto da capa, de Nana Moraes, traz o artista pintado de preto e dourado, numa hipotética alusão aos resultados de uma erupção do Vesúvio.
Não espere de Djavan qualquer canção que te leve a ir entusiasticamente até o chão, abrir a rodinha ou rebolar na boca da garrafa. A música de Djavan é para serenar, para refletir, para sonhar, para namorar, para amar, para acompanhar batendo o pé ou balançando suavemente a cabeça na cadência do Samba ou do Funk, mas sem estardalhaço ou promiscuidade visual. O que sobra nas suas criações é alma, é coração, é amor. E neste trabalho específico, um tanto de sua paixão pelas plantas, flores, Natureza, família, gente. Mas lá está também, viva!, a política. E mais harmonias requintadas e magistrais intervenções dos músicos que o acompanham: o guitarrista Torcuato Mariano, os pianistas Paulo Calasans e Renato Fonseca, o baixista Arthur de Palla e o baterista Felipe Alves.
A verdade é que quase ninguém, lamentavelmente, vai ver ou ouvir as canções deste disco na TV, no rádio e ou em qualquer outra mídia popular. Não vai fazer sucesso, muito menos botar o povo para dançar ou rebolar. Não faz a menor diferença, pois isso jamais foi sinônimo de qualidade. Djavan realmente é para poucos. Quem mais poderia criar versos ao mesmo tempo tão contundentes e simples assim: "Tudo vai mal/Muito sal/Nada vai bem/Pra ninguém/Nessa pressão/Quem há de dar a mão/Pra que o mundo/Saia lá do fundo/Pra respirar/E não morrer?"
Um grande abraço espinosense.    

Álbum "Vesúvio", disponível dia 30 de novembro em formato físico - CD e LP:
1) Vesúvio - 3:38
2) Solitude - 3:13
3) Dores Gris - 3:15
4) Tenho Medo de Ficar Só - 3:14
5) Cedo ou Tarde - 4:45
6) Orquídea - 3:41
7) Viver é Dever - 4:35
8) Madressilva - 3:33
9) Mãos Dadas - 4:29
10) Meu Romance - 4:16
11) Entre Outras Mil - 3:24
12) Um Quase Amor - 2:54
13) Esplendor (Faixa Bônus) - Jorge Drexler - 4:12


 


Vesúvio
Djavan

Você quis namorar e eu achei divertido
Mas o mar tem onda
Começou a rolar, foi ganhando sentido
Todo mar tem onda
Quando vi já não havia  nada no prumo
O sol é de ouro
O que dá pra fazer quando se perde o rumo?
O sol cai no mar, no mar, cai no mar
E a onda é de ouro, de ouro, de ouro

Eu nunca achei que fosse nada
Pra ficar e fazer o que fez
E ver você sempre ligada
No que faz pra ter mais toda vez

Você é do amargo e eu sou do azedo
Mas o mar tem onda
Quando for demorar nunca se vá tão cedo
Todo mar tem onda
Nunca tive pra mim que você fosse tanto
O sol é de ouro
Mas, se vai-se de mim deixa um jardim em pranto
E o sol cai no mar, no mar, cai no mar
E a onda é de ouro, de ouro, de ouro

Eu nunca achei que fosse nada
Pra ficar e fazer o que fez
E ver você sempre ligada
No que faz pra ter mais toda vez

Quem me dera saber o que nunca foi dito
Mas o mar tem onda
Pra tentar descrever outras formas que habito
Todo mar tem onda
Você tem um poder que me lembra o Vesúvio
O sol é de ouro
Que na foz do prazer me transforma em dilúvio
E o sol cai no mar, no mar, cai no mar
E a onda é de ouro, de ouro, de ouro





Solitude
Djavan

Amor em queda
Mesmo tal moeda
Perde cotação
Um mundo louco
Evolui aos poucos
Pela contramão
O erro invade
Tudo o que é cidade
Cai na imensidão

Guerra vende armas, mantém cargos
Destrói sonhos, tudo de uma vez
Sensatez
Não tem vez

Vidas fardos, meros dados
Incontáveis casos de desamor
Quanta dor
Muita dor

Parece tarde
Falar de amizade
Ver com o coração
E desse jeito
Reparar defeito
Estendendo a mão

Guerra vende armas, mantém cargos
Destrói sonhos, tudo de uma vez
Sensatez
Não tem vez

Vidas fardos, meros dados
Incontáveis casos de desamor
Quanta dor
Muita dor

Quem é que sabe
O quanto lhe cabe
Dessa solitude?
Por isso a hora
De fazer é agora
Tome uma atitude