As perdas significativas de pessoas admiradas e queridas parecem não ter fim. Não há, entretanto, como fazer cessar as engrenagens inexplicáveis dos nossos destinos. Assim é a vida. A única certeza é de que a nossa hora um dia chegará, e temos que estar prontos para a viagem.
Neste sábado, 4 de junho, mais uma notícia triste vem golpear severamente os amantes dos esportes. O gigante do boxe, um dos maiores pugilistas de todos os tempos (certamente o maior), Cassius Clay ou Muhammad Ali, faleceu aos 74 anos de idade, devido a problemas respiratórios. Ali lutou bravamente por mais de trinta anos contra a Doença de Parkinson, que o acometeu em época próxima à sua retirada dos ringues.
Cassius Marcellus Clay Jr. nasceu aos 17 de janeiro de 1942, em Louisville, Kentucky, EUA. Ainda jovem, começou no boxe, e em 1960, nos Jogos de Roma, conquistou o título olímpico e a medalha de ouro na categoria dos meio-pesados ao vencer o polonês Zigzy Pietrzykowski.
Depois de 19 lutas no currículo, todas com vitórias, sendo 15 por nocaute, ele chegou à conquista do título de campeão mundial dos pesados com apenas 22 anos, ao bater Sonny Liston, por nocaute no sétimo round, em luta realizada em 25 de fevereiro de 1964, em Miami, Flórida. Com essa vitória tornou-se campeão da Associação Mundial de Boxe e do Conselho Mundial de Boxe. Naquele momento já podia se notar sua personalidade forte, sua incontida autoconfiança, sua força esplêndida, seu talento excepcional e, claro, sua arrogância fulgurante e desafiadora.
De posse do cinturão de campeão mundial, resolveu então se converter à religião muçulmana, se rebatizando com o nome Muhammad Ali. Convocado em 1967 a lutar na Guerra do Vietnã, Ali recusou-se prontamente, sendo preso e condenado à pena de cinco anos em primeira instância. A partir daí passou também a ser um porta-voz das reivindicações dos negros americanos, juntando-se a outros ícones da luta contra o racismo nos Estados Unidos, os ativistas Martin Luther King e Malcolm X.
Pela recusa em combater na guerra, teve seus títulos confiscados e ficou impedido de lutar por cerca de quatro anos, até que a Suprema Corte decidiu, em última instância, o absolver.
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Voltou aos ringues no ano de 1970 e no ano seguinte, em 8 de março de 1971, enfrentou o grande boxeador Joe Frazier, em luta realizada no Madison Square Garden, em Nova York, onde perdeu pela primeira vez na carreira, por pontos. Dali a três anos, conseguiu a revanche contra Frazier e o derrotou, também por pontos, em 28 de janeiro de 1974, em Nova York.
Mas a luta que entrou para a história como a mais significativa de todas foi o confronto entre ele e George Foreman, chamado de "The Rumble in the Jungle (O Estrondo na Floresta), realizado em Kinshasa, no Zaire, em 30 de outubro de 1974. Durante a preparação para a luta no país africano, com todo o seu carisma e sua eloquência verbal, Muhammad Ali conquistou facilmente os corações dos habitantes do Zaire e se tornou um ídolo no país. Na luta épica entre os dois gigantes do boxe mundial, Ali venceu Foreman por nocaute, faltando 11 segundos para o término do oitavo round, não sem antes levar muitos e duros golpes do oponente. Sabedor da força física de seu oponente bem mais jovem, Ali usou a perigosa estratégia de se esquivar o tempo todo e de cansá-lo durante a luta, para só no final usar seus punhos para nocauteá-lo espetacularmente.
Ali enfrentaria novamente Joe Frazier em outra luta memorável, agora em Manila, nas Filipinas, no dia 1º de outubro de 1975, conquistando mais uma vitória, desta vez por nocaute técnico. Em 15 de fevereiro de 1978, em Las Vegas, Nevada, sofre sua terceira derrota na carreira, perdendo o título para Leon Spinks. Pouco tempo depois, porém, em 15 de setembro de 1978, em Nova Orleans, Luisiana, enfrentou-o novamente e o derrotou por decisão unânime dos juízes, recuperando o título de campeão dos pesados. Já com os primeiros sintomas do Mal de Parkinson, ele resolveu se retirar dos ringues em 1979. Um ano depois, tentou retomar a carreira, mas não era mais possível manter o desempenho de campeão e foi facilmente batido pelo oponente Larry Holmes. Depois de perder mais uma luta na carreira, desta vez para o pugilista Trevor Berbick, não havia mais dúvidas de que era hora de sair de cena aos 39 anos de idade. Assim, em 1981, o ídolo americano do boxe, uma verdadeira lenda do esporte, o grande Muhammad Ali, defensor dos seus iguais, anunciava a sua aposentadoria. Pouco tempo depois, em 1984, ele foi diagnosticado com a Doença de Parkinson, que durante longos anos o debilitou profundamente, impedindo mais aparições públicas suas. Uma das mais emocionantes aconteceu na abertura das Olimpíadas de Atlanta (USA), em 1996, onde ele, caminhando com dificuldade e muito trêmulo, foi aplaudido efusivamente ao acender a pira olímpica.
Muhammad Ali destacou-se como um dos melhores atletas da sua modalidade no mundo, com sua incrível velocidade na aplicação dos socos, seu excepcional jogo de pernas, sua facilidade em se esquivar dos golpes adversários, sua impressionante capacidade de absorção de pancadas e a notória mordacidade nas palavras. E não só. Ele entrou para a história como um ícone do esporte que não teve medo de enfrentar as injustiças contra o seu povo, colocando sua carreira e vida em defesa das suas ideias, em um tempo de muito ódio e intolerância em seu país. Que seu exemplo de vida continue perene, influenciando milhões de jovens pelo mundo. Lutar sempre, e sem medo.
Um grande abraço espinosense.
Frases de Ali:
"Sei aonde vou e sei o que é a verdade. E não tem por que ser o que você quer que seja. Sou livre para ser aquilo que quero ser."
"Sou o maior. Disse isso a mim mesmo inclusive antes de saber que o era."
"Não vou percorrer 10.000 quilômetros para ajudar a assassinar um país pobre simplesmente para dar continuidade à dominação dos brancos sobre os escravos negros."
"Um homem que enxerga o mundo aos 50 anos da mesma forma que aos 20, perdeu 30 anos de vida."
"Não divido o mundo entre os homens modestos e os arrogantes. Divido o mundo entre os homens que mentem e os que dizem a verdade."
"No golfe eu também sou o melhor. O único problema é nunca joguei golfe."
"O silêncio vale ouro quando não se consegue achar uma boa resposta."
"O boxe é um monte de brancos vendo como um negro vence outro negro."
"Quando você tem razão, ninguém se lembra disso; quando está errado, ninguém esquece."
Muhammad Ali tinha uma inteligência especial e um bom-humor sarcástico e contundente, como pode-se atestar nesta entrevista contida no vídeo abaixo, onde ele fala sobre o racismo. Um sutil tapa na cara da sociedade americana e, por que não, na nossa também. Não deixe de assistir e refletir.
História pessoal:
Muhammad Ali-Haj, nascido Cassius Marcellus Clay Jr.
Nascimento: 17 de janeiro de 1942, Louisville, Kentucky, EUA
Falecimento: 3 de junho de 2016, Phoenix, Arizona, EUA
Cônjuge: Yolonda Williams (de 1986 a 2016)
Filhos: Laila Ali, Rasheda Ali, Hana Ali, Asaad Amin, Maryum Ali, Jamillah Ali, Khaliah Ali, Muhammad Ali Jr. e Miya Ali.
Lutas: 62
Vitórias: 57
Vitórias por nocaute: 37
Derrotas: 5
Empates: 0