Espinosa, meu éden

Espinosa, meu éden

terça-feira, 3 de março de 2020

2373 - A tragédia de Amélia fascina Espinosa

Quem passa atento pela Avenida Minas Gerais em Espinosa, quase em frente à residência dos prestigiados médicos João e Maria Coeli, percebe, sem muito esforço, do lado esquerdo da via em direção à Bahia de Castro Alves, Caetano, Gal, Betânia, Gil, Raulzito e do acarajé, duas cruzes de madeira grossa e escura fincadas lado a lado na terra do Sertão Norte-Mineiro. Elas remetem à finada Amélia e seu filho em gestação.   
Os mais jovens espinosenses, parece-me que jamais ouviram falar daquela história triste, e muitos dos mais antigos da cidade parecem ter se esquecido dos detalhes dolorosos do covarde assassinato da jovem, bonita e tímida Amélia Freire Alkimin em Espinosa, exatamente em uma sexta-feira, 15 de julho de 1904. 


E por que isso tudo repentinamente veio à tona, aguçando a curiosidade de boa parte da população espinosense interessada em Cultura? A resposta é extremamente positiva, digna de ser comemorada. 
Toda essa comoção, se é que podemos chamar assim com talvez um pouco de exagero, é fruto de um excelente e laudável trabalho da Coordenadora da Biblioteca Municipal Professora Dulce Cardoso França Cruz, a dedicada e competente professora Rita de Cássia Gonçalves Lopes, na realização de um projeto cultural na divulgação, em forma de capítulos em vídeos, da enternecedora história de vida e morte da jovem garota Amélia, assassinada brutal e covardemente pelo próprio esposo Evaristo Antunes de Souza, irmão do Bispo Dom Lúcio Antunes de Souza, este que dá nome a uma das mais conhecidas ruas do centro da cidade. O projeto que está em curso pretende espalhar ao público as mais precisas informações sobre a história da cidade de Espinosa que no dia 9 de março próximo estará completando seus 96 anos de emancipação política.  


Usando como fonte o livro "Lençóis do Rio Verde – Crônica do Meu Sertão", de autoria do nosso brilhante conterrâneo administrador, bancário aposentado, fazendeiro e, nas horas vagas, historiador, genealogista e escritor no gênero de crônicas, Daniel Antunes Júnior, Rita apresenta diariamente aos internautas do Facebook, porções da história dolorosa da nossa conterrânea vítima de um crime passional. Conta o escritor Daniel que, enciumado com a possibilidade de estar sendo traído pela jovem e bela esposa, posto que sempre se ausentava pelas constantes viagens na profissão de tropeiro, o marido supostamente enganado não se aguentou de ódio e de vergonha dos familiares e amigos e arrastou sua companheira grávida para a morte, de forma extremamente violenta, utilizando-se de uma arma perfurocortante na calada da noite.


A história é triste e o crime cometido foi bárbaro e covarde, com a retirada cruel de duas vidas inocentes. Mas o tempo passou e mais de um século depois, pouca coisa mudou desde aquelas eras em que as mulheres eram consideradas mercadorias dos seus donos, os esposos ou amantes. Por não trabalharem fora e terem apenas a obrigação de criar os filhos e cuidar da casa e do marido, as mulheres de antigamente, com raras exceções sobretudo nos rincões, eram verdadeiras escravas, dependentes financeiramente, sem direito a quaisquer reclamações, fato não muito diferente de muitas outras hoje em dia. Se as mulheres conseguiram algum espaço e liberdade na sociedade patriarcal brasileira após anos e anos de luta, ainda perdura vergonhosamente no país um machismo retrógrado, vil e pusilânime, que cotidianamente assedia, agride e mata mulheres de forma violenta. Os números das estatísticas revelam até um aumento absurdo dos casos de feminicídio no Brasil nos últimos anos. Uma lástima!


Quem aprecia Arte e Cultura e quiser acompanhar a triste história de Amélia, é só acessar a página da Biblioteca de Espinosa no Facebook e assistir aos vídeos disponibilizados, com a apresentação dos fatos a cargo de Rita de Cássia, com gravação de imagens pela Felicidade Oliveira e apoio de Ana Aparecida Maurício e Ana Lúcia Cardoso. Parabéns a todas elas pela brilhante iniciativa, espalhando nossa história passada pelo presente, informando com maestria os nossos conterrâneos. Que Amélia e seu anjo rebento descansem em paz!


Para informação aos que desconhecem os fatos, a cruz da "Santa" Amélia é protegida por Lei Municipal de Patrimônio Histórico. Há algum tempo, conforme informações a mim passadas, um cidadão espinosense comprou o lote diante da cruz da finada Amélia. Por agradecimento a alguma graça alcançada, ele ali construiu uma linda capela em sua homenagem, fato extremamente elogiado à época. Por razões que desconheço, este senhor vendeu o terreno a outrem, que pretendia usar o espaço para outro fim, jogando por terra a construção. Surgiu então a notícia (ou boato) que pretendia-se também arrancar e destruir o símbolo do martírio de Amélia, o que gerou pronta atuação de Rita e de demais defensores do patrimônio público em Espinosa, quando descobriu-se, felizmente, que o monumento tão apreciado e respeitado pela população consciente da cidade estava protegido por Lei Municipal. Como resultado, o proprietário atual do lote em questão tem então toda a liberdade para usufruir do seu terreno como quiser, mas jamais poderá causar qualquer dano a monumento de tão alto e significativo valor emocional e histórico para o povo de Espinosa.


Para finalizar essa comprida postagem sobre nossa história, não posso deixar de publicar o texto da Biblioteca de Espinosa sobre a homenageada professora Dulce Cardoso França Cruz, com todo o mérito, ressalte-se.

"DULCE CARDOSO FRANÇA CRUZ (1919-1999)
Nasceu em Curvelo (MG), em 26 de março de 1919, filha do Sr. Amerino França e Sra. Alzira Cardoso França. 
Estudou no Educandário Feminino de Nossa Senhora das Dores (Colégio Interno), em Diamantina (MG), onde se formou Professora Normalista.
Em meados de 1943, migrou-se para Espinosa, onde iniciou sua trajetória docente, foi nomeada Professora Normalista do Grupo Escolar Comendador Viana, envolvida numa aura de respeitabilidade e profissionalismo.
Casou-se com o fazendeiro espinosense da tradicional família Cruz, o Sr. Ozorino Caldeira da Cruz, com quem teve seis filhos: Maria Neuza, Amerino, Walter, José Orlando, Haroldo e Dulce Maria.
Nos seus 25 anos de magistério, atuou como professora alfabetizadora exemplar, utilizando pela primeira vez a cartilha "O Livro de Lili", desempenhando suas funções na tessitura mulher-mãe- professora, aquela que na senda do saber e da moralidade, de mãe amorosa, debruçava sobre as frágeis crianças as orientações e transformações por ensinamentos que aguçavam a capacidade natural de acalentar esperanças de uma escola que se erguia como transformadora de consciências.
Também exerceu a direção do Grupo Escolar Comendador Viana no ano de 1957 e aposentou-se em 1968.
Referência no quesito alfabetização em nossa cidade, disseminou suas melhores sementes e excelentes frutos foram e são colhidos.
Faleceu em Espinosa, no dia 20 de julho de 1999, deixando no seu legado o exemplo de Mulher, Esposa, Mãe, Tia, Avó, Bisavó, Professora..."      
Um grande abraço espinosense.        

3 comentários:

Unknown disse...

Parabéns Eustáquio por mais
um belíssimo texto e pelo incentivo ao desporto e à cultura da nossa querida Espinosa.

Unknown disse...

Boa noite Eustáquio, primeiramente te felicito pelo texto tão bonito, e parabéns por manter viva a cultura e historia da sua cidade.
Entrei no seu blog por casualidade, o motivo é que uma prima e eu estamos buscando nossos antepassados e a origem da nossa familia e pesquisando saiu seu blog. O caso é que compartimos o mesmo sobrenome "Tolentino" (me presento: me chamo Kennyta Tolentino Cortêz), e o que sabemos é que nosso bisavô saiu fugindo de uma epidemia de gripe da cidade de Espinosa entre 1912 e 1920 (pensamos que poderia ser pela gripe espanhola), ele passou a viver e formou familia em Capelinha dos Pimenta MG. O que queríamos saber é se tem alguna forma de saber mais sobre a genealogía do nosso sobrenome nessa cidade. Estive lendo bastante sobre Espinosa e percebi que é muito comúm o sobrenome na cidade, existe alguma forma que eu possa pesquisar telemáticamente sobre isso na historia da cidade?
Desculpas pelo textão, se tiver alguna informação e meios para nos indicar estaremos muito agradecidas.
Deixo a sua disposição o meu email: kennytacortez@gmail.com

Obrigado, Un saludo.

Eustáquio Tolentino disse...

Olá, Kennyta! Muito obrigado por estar aqui em nosso blog.

Eu recebo bastantes pedidos de informações sobre os nossos antepassados mas, infelizmente, não possuo informações a respeito deles e nunca me dediquei a procurá-las. Fico lhe devendo esta.

Fico feliz em saber que temos familiares espalhados por todo esse enorme Brasil.

Desejo sucesso e tudo de bom pra você e sua família.

Um grande abraço espinosense.

Eustáquio Tolentino