Espinosa, meu éden

Espinosa, meu éden

sábado, 30 de novembro de 2019

2315 - Aos meus patrões, a minha eterna gratidão

"Antes tarde do que nunca", diz a sabedoria popular! Há algum tempo, queria demonstrar publicamente aqui no nosso blog, de forma ampla e genuína, a minha enorme gratidão aos senhores que me deram oportunidade de trabalho na minha adolescência e juventude em Espinosa. Pois chegou o momento!
Uma das maiores dificuldades dos jovens em cidades pequenas do interior é o encontro de uma oportunidade de emprego, ainda mais dentro das regras legais de contratação. Quando se encontra uma vaga de emprego, normalmente é com salário abaixo do mínimo, sem carteira assinada e sem quaisquer direitos trabalhistas. Atualmente, pelo menos em Espinosa, o cenário melhorou bastante com a proliferação das empresas de confecções. Mas antigamente era tudo muito mais difícil. 
O meu primeiro emprego foi na extinta Casa Fátima, ali na esquina da Rua 9 de Março com a Praça Coronel Heitor Antunes. Eu tinha pouco mais de 13 anos. Minha mãe conseguiu com o proprietário, Seu Guilherme Figueiredo Neto, uma vaga de balconista. A Casa Fátima tinha dois setores comerciais, um na venda de móveis e eletrodomésticos e outro contíguo, na venda de materiais de construção. Foi neste último em que fui alocado para trabalhar ao lado de Seu Antônio, um senhor já de uns 60 anos, e do meu primo-amigo-irmão Marco Aurélio, o Lelo. No setor de móveis, logo ao lado, trabalhava como caixa o meu amigo-irmão Carlos Alberto, o Gaiola. Fiquei ali uns três meses apenas. Naquela época eu era apenas um adolescente tímido e inocente no primeiro emprego e não aceitava muito bem o extremo rigor exigido na função. Certa vez, fui flagrado debruçado no balcão e levei uma bronca de Seu Guilherme, que exigia uma postura totalmente ereta do funcionário no atendimento ao público. O sistema da empresa tinha suas peculiaridades. O cliente comprava o produto na seção de materiais de construção e, de posse da nota com o valor da compra, tinha que se dirigir primeiro ao caixa localizado na loja de móveis para efetuar o pagamento e só após a quitação, retornar e se apossar da mercadoria na seção de compra. Só que às vezes, alguns clientes radicais não aceitavam tal imposição, ainda mais vinda de um reles e fracote rapazinho, e forçavam a barra levando junto à nota a mercadoria. E lá vinham as broncas para cima de mim. Aquilo me incomodava e, de saco cheio, comuniquei à minha mãe que não mais continuaria trabalhando lá. Hoje, adulto, compreendo perfeitamente as exigências de postura e obediência às regras no atendimento feitas por Seu Guilherme, uma pessoa extremamente séria, honesta e educada e que me deu a primeira chance de emprego, o que só tenho a agradecer.   



Após a minha precoce saída da Casa Fátima, minha mãe me arrumou outro emprego, desta vez na Mercearia Ramos da Rua Coronel Domingos Tolentino, a minha Rua da Resina. O proprietário era Albino da Costa Ramos, então esposo da minha querida professora Dona Elza Tolentino Barbosa. Lá, trabalhei por cerca de 2 anos e fiz um monte de amizades com os frequentadores do lugar, sobretudo os açougueiros que ali se reuniam nos finais dos dias de labuta. Tive a felicidade de conviver muito bem com gente da melhor qualidade como Waldir, Ariston, Dezinho, Zezé de Evaristo, Pia, Léo, Joãozinho Cardoso, Seu Antônio Miranda, Tone Fumin, Dona Preta, Sinha, Zequinha Gomes e demais personagens que trabalhavam na área dos fundos do então Mercado Municipal. Durante todo o tempo em que ali trabalhei, fui respeitado e tratado com imensa consideração, o que me leva a agradecer muito ao Albino e a Dona Elza pelo carinho e pela oportunidade de trabalho.     


 
A natureza do trabalho na mercearia era um tanto pesado, com a necessidade de, às vezes, ter de se carregar de um lado para outro, sacos de açúcar ou arroz, por exemplo. Assim, novamente minha querida e saudosa mãe batalhou para conseguir um emprego menos desgastante para mim. Após uma boa insistência, conseguiu uma disputada vaga no muito bem-conceituado escritório de contabilidade de José Jorge, a Contabilidade Jorge, localizado bem pertinho de casa, na Travessa Francisco Lopes. Não tive dúvidas. Por mais que eu gostasse do trabalho e da turma que eu convivia na mercearia, no escritório eu iria trabalhar em uma área mais tranquila, mais cerebral, e o melhor, com folga no sábado a partir do meio dia. Zé Jorge era muito exigente, mas também era super justo. Se cobrava pontualidade na chegada ao trabalho, era pontual ao extremo também no final do expediente, com saída exatamente às 17 horas diariamente. Para mim que precisava ir para o treino do futebol à tardinha, era uma maravilha. Especial também foi a convivência fraterna e a amizade duradoura com os colegas: José Protácio, Lúcio Balieiro, Fernando (Nego), Carlos Alberto (Gaiola), Mílton de Lourinho, Carlinhos Barbosa, entre outros. Como nos empregos anteriores, nunca tive problemas com salários atrasados. A face ruim de todos eles, que não posso deixar de revelar, era o valor do salário pago, sempre bem menor que um salário-mínimo, além de não ter carteira assinada ou qualquer outra cobertura trabalhista.



No semestre final de 1982, finalmente o saudoso Padre Martin Kirscht conseguiu realizar o seu sonho de colocar em funcionamento uma rádio católica na cidade de Espinosa. Ele havia trazido toda a aparelhagem necessária da Alemanha e só aguardava os trâmites legais e burocráticos para colocar a rádio em atividade. Era uma boa oportunidade de trabalho, já que seriam oferecidos alguns empregos com salário-mínimo e com carteira assinada. Candidatei-me à vaga de auxiliar de escritório para trabalhar com Hildebrando Cirqueira e fui contratado em setembro, tomando posse imediatamente. Meu colega de Contabilidade Jorge, Lúcio Balieiro, também foi contratado como locutor. O presidente da Fundação Padre Martin Kirsch, que comandava a rádio denominada Educadora de Espinosa, era o juiz Juraci Barbosa Lima, que convidou um amigo seu de Belo Horizonte, o jornalista Otacílio Lage, para ser diretor. Recordo-me até hoje o dia em que ele, o Otacílio, entusiasmado, nos comunicou a liberação do órgão do governo para a estreia da rádio. O ambiente de trabalho na Rádio Educadora era muito harmonioso e tranquilo e nos dois meses apenas em que trabalhei lá fiz algumas amizades e tive tempo suficiente para estudar um pouco para o concurso do Banco do Brasil que, adiante, mudaria completamente minha caminhada na vida. Infelizmente a Rádio Educadora não existe mais, assim como o prédio que a acolheu, derrubado tempos atrás.




Ao Seu Guilherme, ao Albino e Dona Elza, ao Zé Jorge, ao Juraci, ao Otacílio e ao Bandin, todo o meu agradecimento, gratidão, carinho e respeito por terem acreditado em mim e em meu trabalho. Muito obrigado por tudo e que Deus os abençoe onde estiverem.
Aproveitando o assunto de emprego e antes que alguém exija minha posição pessoal quanto à matéria, vou deixar bem nítida a minha opinião sobre a questão do trabalho infantil, que sempre causa alguma polêmica no país. Entendo que criança não deve trabalhar jamais, mas defendo que adolescentes possam ajudar os pais em tarefas de negócios de família, sem atividades pesadas e sem quaisquer prejuízos aos estudos e ao lazer. Apoio também o trabalho em funções de aprendiz em empresas legais e obedientes às normas vigentes, respeitando horários livres para estudo e divertimento. Por mais que eu tenha ganhado um dinheirinho e aprendido um tanto com meus empregos na adolescência, gostaria mesmo é de não precisar trabalhar e aproveitar melhor meu tempo de jovem para me divertir e focar nos estudos, assim como, graças a Deus, consegui proporcionar aos meus dois filhos.
Um grande abraço espinosense.   

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