Espinosa, meu éden

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quinta-feira, 24 de maio de 2018

1975 - Taiguara, guerreiro da música, da paz e da liberdade

Nesses tempos modernos da música, onde predominam o som eletrônico, as dançantes batidas frenéticas e letras paupérrimas e pouco inspiradoras, bate uma saudade daqueles artistas que tinham muito a dizer em suas canções. Gonzaguinha, Raul Seixas, Renato Russo, Cazuza e Taiguara são alguns desses trovadores que já se foram deixando uma enorme lacuna para trás, mas que se mantém vivos e energizantes através das suas composições eternas.
Taiguara Chalar da Silva não era brasileiro. Nasceu em 9 de outubro de 1945, na cidade de Montevidéu, no Uruguai, de pai uruguaio e mãe brasileira. Deixou este mundo na cidade de São Paulo aos 14 de fevereiro de 1996, há 22 anos, por conta de um câncer. Ainda menino, aos 4 anos, chegou ao Brasil. Aos 8 anos ganhou do avô um piano e logo em seguida, aos 10 anos, começou a compor suas músicas. E fez sucesso com suas belas criações como "Hoje", "Universo no Teu Corpo" e "Que as Crianças Cantem Livres". Começou tocando em bares e lançou seu primeiro disco, de Bossa Nova, intitulado "Samba de Copo na Mão". Aí vieram as músicas românticas em belas melodias. Até que se desencadeou o seu espírito libertário nas canções e surgiram as letras engajadas, causando náuseas ao regime ditatorial de então, que o censurava constantemente. Participou de muitos festivais de música nos anos 60 e 70, se fazendo notar com o sucesso "Modinha" de Sérgio Bittencourt, com a qual venceu, em 1968, o 1º Festival Nacional de Música Popular Brasileira, como melhor intérprete.



Era um homem de ideias revolucionárias, que cantava e lutava pela liberdade, o que lhe custou severa perseguição política. Ainda jovem, deixou a faculdade de Direito para se dedicar exclusivamente ao que mais amava, a música. Com suas canções engajadas na defesa da liberdade, tornou-se o artista mais censurado pela ditadura militar brasileira, com nada menos que 68 canções censuradas. Desencantado com o cerceamento à sua liberdade criativa, resolveu se auto-exilar na Inglaterra em 1973, retornando ao Brasil em 1975, quando gravou o álbum "Imyra, Tayra, Ipy - Taiguara". Como este trabalho foi completamente censurado, com todas as cópias retiradas de circulação das lojas pela censura da ditadura em apenas 72 horas depois de seu lançamento, ele resolveu novamente se exilar no exterior, morando em Paris, Londres e alguns lugares na África, só voltando ao país no início dos anos 80, exatamente no ano de 1983, quando retomou a carreira musical, sem muito sucesso.
Se naqueles tempos sombrios, seu talento foi impedido de se manifestar livremente e de alcançar a mente dos ouvidos dos amantes de uma boa música, a Internet é o espaço mágico que nos permite ouvi-lo agora e a qualquer momento.
Logo abaixo vocês poderão ouvir na íntegra o famoso álbum censurado, denominado "Imyra, Tayra e Ipy - Taiguara", cujas palavras em tupi-guarani significam: Imyra - árvore, madeira, pão; Tayra - filho; Ipy - cabeça de geração, primeira origem e Taygoara - forro, livre, senhor de si. O histórico disco de Taiguara teve arranjos de Hermeto Paschoal e regência de Wagner Tiso. Contou com um elenco de grandes músicos, dentre eles, Jacques Morelenbaum, Toninho Horta, Novelli, Nivaldo Ornellas e José Eduardo Nazário. Taiguara continua eterno com sua música, com ou sem censura. 
Um grande abraço espinosense.

"A pior luta que eu já empreendi até hoje, a mais difícil e ao mesmo tempo a mais encantadora, a mais gostosa, é a luta que a gente empreende contra si próprio, a luta que a gente empreende para se tornar um ser humano melhor." (Taiguara)




Que as Crianças Cantem Livres
Taiguara

O tempo passa e atravessa as avenidas
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé
E o vento forte quebra as telhas e vidraças
E o livro sábio deixa em branco o que não é

Pode não ser essa mulher o que te falta
Pode não ser esse calor o que faz mal
Pode não ser essa gravata o que sufoca
Ou essa falta de dinheiro que é fatal

Vê como um fogo brando funde um ferro duro
Vê como o asfalto é teu jardim se você crê
Que há sol nascente avermelhando o céu escuro
Chamando os homens pro seu tempo de viver

E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer...